sábado, 15 de março de 2014

antes do tremor:  
com um mover de dentes anuncio aquele vento perigoso que te escalda rosto seco, que te invade olho toda cava. prevejo aquele terremoto que te treme o ponto cego, treme e  inunda a área surda. pra te salvar, deita aqui que te perturbo, que dou um golpe de pernas, um gole de bebida ardente e te deixo manso. pescaria nos lençóis: tua carne anzol, minha boca de peixe faminto e inconsequente; tua cara isca, meu olho fome. me pede um amor calmo que te cubro de café amargo,  beijos em plena plataforma, promessas difíceis, traições sem nome, noites de coluna rente ao chão. me pede uma calma quente que palpito como uma enxaqueca diante do sol ao meio-dia, que explodo junto ao êxtase das horas curvas, que fico calma feito a louça na pia cheia. manhã tarde e noite  pensando quando esse chão vai desabar, quando que vem o descanso da ira, a negação da fuga. te convenço a ficar te apresentando a anatomia da casa, o prazer do tédio, a embriaguez do medo.  


tremor: 
chega súbito. mas mansas são tua dores. desaba o corpo firme, escorre. o prazer pela dificuldade: tabuada do oito, saber não ser, preferir  gozo ao nome, preferir o riso à honra, esquemas geométricos, idiomas mortos. teu ofício é trair os símbolos, as associações infalíveis, a linguagem e seus sentidos obscuros. com teu corpo quebras os sentidos insondáveis, rompes com as verticalidades, fundas um solo de terra úmida sobre cada metafísica. não te salvo porque tua salvação seria se perder. não te guardo, que teu berço é tudo que oscila. o olho do furacão, a pálpebra cansada ou jubilosa, a língua úmida sabotando as regras do idioma. olho pro teu rosto em pleno espanto,  tudo em ti desaba e teu sorriso resta.